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Teatro: R&J de Shakespeare - Juventude Interrompida

O ponto de partida é a sala de um rígido colégio interno inglês católico dos anos 1980. Após a aula, quatro estudantes se envolvem às escondidas em uma leitura de uma cópia de Romeu e Julieta, de Shakespeare, e decidem viver a famosa história dos amantes de Verona. Atraídos pela perspectiva de luxúria e violência, o que eles desejam é experimentar, expressar, sentir e amar. No texto do dramaturgo norte-americano Joe Calarco, famoso no circuito Off-Broadway, a peça dentro da peça funciona como uma válvula de escape da realidade opressiva e também combustível para uma reflexão sobre a sexualidade de adolescentes em conflito. Vestindo uniformes idênticos, um terno de veludo todo vermelho que, ao longo do espetáculo, é manuseado para virar outras possibilidades, como uma saia, por exemplo, o quarteto entra no palco recitando fragmentos de orações, desfiando teoremas de matemática, vomitando regras de comportamento e conjugando o verbo amar em latim.

Um dos jovens, que logo assume o papel de Romeu, tenta seduzir os demais a mergulhar naquele universo de rivalidade entre clãs familiares. De início, há uma certa resistência à ideia por parte dos colegas – um deles, inclusive, inclina-se a improvisar de forma infantil, especialmente na hora de incorporar as mulheres do enredo. Aos poucos, no entanto, vão se inebriando pelas palavras, impacto e beleza da trama, Ou seja, à medida que começam a assumir os diversos personagens, eles se descobrem exercitando os seus próprios sentimentos sexuais, medos e ansiedades. Se no começo, por exemplo, os garotos revelam-se brincalhões, no decorrer da montagem dão nexo a um manual de psicologias diversas e variados estratos sociais. É nítida a analogia que o autor tece entre o cotidiano sufocante de uma escola particular e o mundo cheio de códigos sociais de Romeu e Julieta. O interessante é que a cena metalingüística se estabelece sem nunca cansar o público, além de escapar dos clichês e injetar humanidade aos personagens. Trata-se de uma tragédia clássica, que se deixa contaminar pela urgência contemporânea.

A encenação simples, despojada e criativa de João Fonseca ganha eletricidade em seu transcurso. O cenário é reduzido apenas a um círculo de madeira, mesas e cadeiras da escola, com alta dosagem simbólica. Não é um trabalho fácil, como podem imaginar alguns. O jogo das relações entre os estudantes precisa ser executado em sintonia com o jogo do relacionamento entre Romeu e Julieta, como faces de uma moeda. Para dar conta do desafio, a direção buscou desidratar o conteúdo trágico da história e deixou emergir algum registro de humor, adicionando ainda intervenções e vinhetas de músicas pop. Em harmonia com a proposta, o elenco desvencilha-se da tarefa com desenvoltura vocal, técnica refinada e bastante fôlego. Eles submergem no texto impulsionados por uma espécie de curiosidade juvenil, desatando as falas com eloqüência e visível paixão. Muitas cenas se destacam, como a do casamento dos protagonistas, emocionalmente carregada e símbolo da conexão existente entre o amor de Romeu e Julieta e o sentimento que une os dois alunos que os interpretam.

A montagem abre frestas para todos brilharem, o que é bem aproveitado pelo grupo. Cada um se incumbe de representar três ou quatro personagens e são quase que irrepreensíveis na missão. Sensível e sem exageros, Rodrigo Pandolfo interpreta Julieta com uma feminilidade autêntica, sem cair na armadilha de fazer dela uma caricatura do sexo feminino. Felipe Lima captura a virilidade de Mercucio e rearticula a linguagem gestual na hora de viver a Sra. Capuleto. Pablo Sanábio oscila da raiva latente de Teobaldo para a graça da Ama. Na pele de Romeu, Gabriel Vasconcelos entrega uma performance que, se não chega a arrebatar, encontra espaço para produzir faíscas na platéia. Não se trata de um espetáculo imune a defeitos, mesmo porque o texto de Calarco escorrega em algumas limitações. Os jovens nunca se comunicam em suas próprias palavras, exceto as necessárias para armar a brincadeira proibida, o que impede o afloramento das suas personalidades individuais. Além disso, oferece quase nada de elementos sobre as razões da escola em refutar a leitura de Shakespeare. Por conta também do ritmo acelerado, o desenvolvimento da trama cria obstáculos para os necessários momentos reflexivos. Certamente questões digeríveis em uma montagem que celebra o poder da literatura sobre a imaginação.

(Edgar Olimpio de Souza – O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )

(Foto Luiz Paulo Nenen)

 

Avaliação: Ótimo

 

R & J de Shakespeare – Juventude Interrompida

Texto: Joe Calarco                                                                                                             

Direção: João Fonseca                                                                                                      

Elenco: Felipe Lima, João Gabriel Vasconcellos, Pablo Sanábio e Rodrigo Pandolfo               

Estreou: 14/01/2012                                                                                                              

Espaço dos Fofos Encenam (Rua Adoniran Barbosa, 151, Bela Vista. Fone: 3101-6640). Sexta e sábado, 21h; domingo, 18h. Ingressos: R$ 40. Até 29 de abril.
 

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