EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Teatro: Os Altruístas (RJ)

Os personagens principais desta farsa satírica são jovens que desejam fazer a diferença e construir um mundo melhor. No entanto, sentem dificuldades em saber as razões pelas quais estão pregando e discursando. Talvez se sintam mais à vontade em descobrir quem está dormindo com quem. Trata-se de uma certa juventude radical que passa o tempo entre passeatas, discussões e manifestações de cunho social, além de se entregar ao ócio. Eles protestam contra cortes na educação, apóiam a salvação de baleias, marcham em defesa dos homossexuais, das crianças e das mulheres. Não importa sobre o que estão bradando, desde que se sintam participantes. O cardápio de temas para protestar é extenso. Esses ativistas pulam de causa em causa com a mesma facilidade com que trocam de roupa. Embora argumentem que lutam pelo bem da coletividade, no fundo carecem de moral, são autocentrados, egoístas e violentos. Nesse texto ágil e verborrágico, que ganhou montagem assinada por Guilherme Weber, o autor norte-americano Nick Silver expõe personagens que são um pouco de tudo, menos altruístas, num retrato do narcisismo estéril dos tempos atuais.   

A moralidade dessa turma entra em parafuso no momento em que se descobre um corpo e é preciso decidir o que fazer com ele. Sidney (Mariana Ximenes) cometeu um ato desvairado ao lastimar como as coisas aconteceram de forma tão equivocada em seu relacionamento. Carente, ciumenta e materialista, ela é uma atriz de novela que acredita estar prestando serviço social por meio do insípido trabalho. Seu companheiro, Tony (Miguel Thiré), um bon-vivant que aprecia o ótimo salário da namorada, é tão apaixonado por si mesmo que gasta mais tempo com seus casos extraconjugais do que se dedicando ao ativismo político – ele freqüenta comícios para turbinar sua lista de conquistas sexuais. Sidney é amiga de Ronald (Kiko Mascarenhas), líder dos agitadores políticos, um assistente social homossexual que se veste de mulher e, no momento, está apaixonado por um michê, Lance (Jonathan Haagensen). Há um quinto personagem, Vivian (Stella Rabello),  uma lésbica xiita envolvida em tantas causas que ela nem lembra a que marcha irá comparecer naquele dia – suas tentativas desesperadas de se lembrar dos comícios rendem momentos engraçados no espetáculo. O ímpeto com que vai aos atos políticos é o mesmo com que Sidney se lança às compras de Gucci e Prada.    

As cenas se alternam em três apartamentos. Como em outros textos de Silver, os personagens monologam mesmo quando estão despudoradamente empenhados em dialogar – não por acaso, muitas falas são dirigidas a um sujeito anônimo totalmente indiferente na cama de Sydney. A crítica ferina que o autor desembrulha mirando a hipocrisia dos  manifetantes profissionais, não chega a ser tão afiada quanto a navalha que retalhava os personagens de Pterodátilos, recentemente encenada em São Paulo. De certa forma, o roteiro se torna até repetitivo ao não avançar além da mera exposição. O autor examina a vida dessas figuras com diálogos rápidos e secos, iluminando o fato de que eles vivem apenas o presente e são incapazes de visualizar o futuro. É sintomático que, à certa altura, um deles revela: “Eu amo amo o mundo, são as pessoas que eu não suporto”. Estreante na direção, GuilhermeWeber mantém o quinteto o tempo todo no palco, articulando uma encenação de ritmo fluente, mas não vertiginoso. Ela se desenvolve no tempo necessário, com as cenas se conectando naturalmente, num trabalho difícil porque as ações em espaços diferentes precisam se tornar uma história. Mesmo com o apelo do humor subjacente da trama, Weber procurou enfatizar as relações entre os personagens. Na sugestiva cenografia, Daniela Thomas desenhou o palco como uma caixa preta, com inscrições a giz nas paredes, jogo de espelhos e apenas três camas.  

Mariana Ximenes encaixa interpretação adequada a uma farsa que exige domínio técnico do tempo. Ela abre o espetáculo despejando um monólogo rápido e nervoso, que ela contorna com verve escapando de uma possível chatice. Haagensen cativa na pele do michê ingênuo e ao mesmo tempo patético. Mascarenhas imprime o tom certo às afetações de seu personagem, com muitas expressões divertidas e sarcásticas. Thiré poderia equilibrar melhor o humor e a maldade do fanfarrão mergulhado no grau máximo do narcisismo. Stella Rabello interpreta a mais triste dos altruístas, a lésbica que descobre o amor quando justamente o perdeu. Silver não chega a tecer uma reflexão adensada sobre a tese de que o ativismo político obcecado por melhorar o mundo não é tão diferente assim do ativismo, por exemplo, de um capitalista de olho no mercado. Deixa para o espectador, no entanto, a provocação de que ambos não passam de figuras cínicas e caricatas.

(Edgar Olimpio de Souza – O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo. )

(Foto João Caldas)

 

Avaliação: Bom

 

Os Altruistas

Texto: Nick Silver                                                                                                         

Direção: Guilherme Weber                                                                                              

Elenco: Mariana Ximenes, Kiko Mascarenhas, Miguel Thiré e outros                              

Estreou: 16/09/2011                                                                                                              

Espaço Tom Jobim (Rua Jardim Botânico, 1008, Jardim Botânico. Fone: 2274-7012). Sexta e sábado, 20h30; domingo, 20h. Ingresso: R$ 60. Até 12 de fevereiro de 2012.

 

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