EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Melancolia

A abertura, em ultra câmera lenta, é um balé de imagens desconcertantes que de alguma forma antecipam eventos da história a ser contada. Ao som da ópera de Tristão e Isolda, de Wagner, aves despencam do céu, um cavalo empina no ar, uma noiva tenta se desvencilhar de ervas daninhas, um planeta desconhecido se aproxima da Terra. Aparentemente desconexo, o prólogo estilizado e sombrio narra em viés poético o fim do mundo. O longa do provocador Lars Von Trier (Anticristo) não é uma ficção científica, mas um drama burguês que flerta com o épico. Há outros momentos hipnotizantes, como uma floresta fantasmagórica e uma personagem despida sob a luz do luar. Neste filme autoral sobre a vitória do infortúnio, o cineasta dinamarquês despeja sua crítica cortante ao modo de vida humano e aos rituais convencionais criados pelo homem, como o casamento, em sua opinião um ardil para desviar a atenção do vazio existencial.    

A trama se desdobra em dois capítulos. Filmado em registro documental e pontuado por diálogos de ácida franqueza, o primeiro começa com uma limusine branca, que encontra dificuldades para manobrar em uma estrada estreita. A bordo, o casal de noivos Justine (Kirsten Dunst) e Michael diverte-se com a situação. Eles estão atrasados para a suntuosa cerimônia num castelo, organizada com esmero pela irmã dela, a centrada Claire (Charlotte Gainsbourg), e o cunhado (Kiefer Sutherland). A alegria da festa, no entanto, é desconstruída aos poucos. A mãe da noiva, num discurso azedo, conclama os noivos a aproveitarem o casamento enquanto ele não implode. O pai distante não é menos inconveniente. Justine deveria estar feliz, mas se comporta de maneira alienada e de vez em quando se ausenta do salão – chega a transar com um desconhecido numa de suas saídas. Nitidamente está deslocada e incomodada com as exigências e rigores da programação. O banquete, povoado de personagens insossos ou manipuladores, é acompanhado com câmera na mão pelo diretor – as cenas fluem ágeis, exceto aquelas em que a noiva olha para o céu e avista uma estrela diferente.Na segunda parte, mais intensa, a personagem central passa a ser Claire. Se até ali se radiografavava um cataclisma familiar e conjugal, agora é o mundo exterior que está prestes a naufragar, por conta da aproximação perigosa de um enorme planeta azul chamado Melancolia, que os cientistas garantem não estar em rota de colisão com a Terra – o marido de Claire é um desses que crêem na invulnerabilidade da humanidade. A ação trasncorre no mesmo castelo. Uma mudança de temperamento acomete as irmãs.

Já separada, Justine renunciou à vida, exibe uma tranquilidade embriagante, apaziguada com a iminência do fim do mundo. Claire está paralisada pelo pânico e desespero. O jogo de inversões é caprichoso. Dentro do universo conhecido, Justine movia-se em desequilíbrio e recupera o prumo frente ao desconhecido. Ela parece não ter mais nada a perder. Submissa e integrada às regras e etiquetas, Claire perde o eixo exposta ao que não conhece – casada e mãe, vê ameaçado o mundo idealizado que construíra e, claro, não encara o apocalipse com a mesma serenidade da irmã. A tragédia que se anuncia não recebe tratamento de choque por parte do diretor, que dispensa ferramentas típicas do gênero, como uma possível histeria coletiva e destruição em massa. Trier prefere investir na corrosão psicológica dos personagens. Não há uma fresta de esperança, piedade, um bote salva-vidas. Saído de uma depressão, o polêmico diretor lembra que esse tipo de vida, contaminada por rituais esvaziados e valores desidratados, está por um fio e escancara o desenlace com um olhar reverente, intimista e introspectivo. A melancolia, que não tem um fator objetivo para desencadeá-la, é desembrulhada em camadas superpostas. Como diz um personagem, a vida é assim na Terra. A meditação sobre o fim metafórico da humanidade é cevado com belas e terríveis imagens.           

 (Edgar Olimpio de Souza)

(Foto Divulgação)

 

 

Avaliação: Ótimo

 

Melancolia

Título Original: Melancholia (Dinamarca/França/Alemanha/Itália/Suécia, 2011)

Gênero: Drama, 130 min                                                                                               

Direção: Lars von Trier

Elenco: Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg, Kiefer Sutherland e outros                  

Distribuidora: Califórnia Filmes

 

Veja trailer do filme:

 

 

 

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