EDITOR: Edgar Olimpio de Souza (O endereço de e-mail address está sendo protegido de spambots. Você precisa ativar o JavaScript enabled para vê-lo.

 

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Love

Cenas de sexo explícito apimentam o novo trabalho de Gaspar Noé, o diretor argentino radicado na França conhecido por suas obras transgressivas, exemplo do contundente filme Irreversível (2002), que exibia um angustiante estupro de intermináveis nove minutos. Rodado em 3D, o atual longa é uma reflexão sobre a sexualidade sem puritanismo, como um aspecto vital de conexão entre os seres humanos. Aqui, a prática está inserida em um relacionamento romântico, diferentemente da cópula vazia típica do cinema pornográfico. A abertura já fornece a medida da vocação de Noé para a polêmica. Murphy (Karl Glusman) se encontra nu, deitado de costas, enquanto Electra (a modelo suíça Aomi Muyock) acaricia seu membro ereto até ele atingir o orgasmo. No momento seguinte, o rapaz está acordado ao lado de Omi (Klara Kristin), enquanto seu filho chora no quarto contíguo.

A trama acontece durante o ano novo em Paris, época ideal para balanços e reavaliações. É o que faz Murphy, um cineasta americano residente na capital francesa, a partir do instante em que ouve uma mensagem da mãe de Electra, aflita com o sumiço há dois meses da filha. A ex-sogra imagina que ela poderia ter cometido suicídio. O episódio ativará uma série de flashbacks depressivos, nos quais o protagonista irá relembrar como sua vida com a ex-mulher foi destruída pela inveja e a lascívia. Ele está especialmente atormentado pelo arrependimento, vivendo infeliz na companhia da namorada adolescente Omi e o pequeno bebê de ambos. Não por acaso, um intertítulo postado na tela alude à famosa lei de Murphy, que reza que tudo o que pode dar errado, certamente vai dar. É exatamente o que sucede com o personagem central, um cineasta que sonha produzir filmes sobre sangue, esperma e lágrimas. Em que pese amar uma mulher, ele acabou engravidando outra. Por meio desses saltos no tempo, sabemos que o casal havia convidado a bela Omi para irem os três para a cama. Mais adiante, o rapaz terá de lidar com as conseqüências inesperadas de uma infidelidade conjugal.   

Noé explora as cenas de transa evitando ângulos de mau gosto, esdrúxulos ou gratuitos. O ménage à trois, por exemplo, é registrado de cima, mantendo-se uma distância elegante dos corpos em frisson. Por outro lado, ele chega a dar close-up em câmera lenta de um pênis ejaculando em direção à tela, valendo-se dos efeitos da técnica da terceira dimensão. O diretor mostra que a conjunção carnal entre duas pessoas pode significar muitas coisas diferentes em momentos distintos dentro de uma mesma relação.

O estilo nervoso de narrar, à base de cortes abruptos, permanece intacto. Em algumas sequências, ele impregna o enredo com um tipo de humor peculiar – na delegacia de polícia, para onde foi levado após furar um antigo amante de Electra, papel interpretado pelo próprio Gaspar Noé, um bizarro Murphy deita falação sobre as diferenças entre os franceses e os americanos. Em outra passagem, de apelo cômico, ele filma o encontro do par central com um travesti, uma das raras vezes em que os atos sexuais são apenas insinuados e não escancarados.

Salpicado por uma trilha sonora que emaranha música eletrônica contemporânea e Bach, o enredo é desenvolvido em parte dentro de um apartamento. Pendurados nas paredes estão cartazes de vários clássicos do cinema mundial, como Saló, Taxi Driver e O Nascimento de uma Nação. Trata-se de uma homenagem do diretor às produções que fizeram parte de sua formação cinematográfica.  

O conturbado romance entre Murphy e Electra, no entanto, não chega a envolver o público, apesar dos sedutores recursos 3D e a estrutura narrativa descontínua do longa. Os personagens carecem de consistência, principalmente as mulheres, retratadas sem vida interior. Não há nada de experimental ou revolucionário na maneira como o sexo é radiografado. Se remover todas as passagens explícitas de penetração, masturbação e sexo oral, o que resta é uma melancólica trama sobre a dor do amor e os seus dissabores, em abordagem meio superficial. Falta substância, como se vê em obras como Ninfomaníaca (Lars Von Trier), Romance (Catherine Breillat), Império dos Sentidos (Nagisa Oshima) ou O Pornógrafo (Bertrand Nonello), que remexem as perspectivas de uma relação de pleno erotismo para transmitir algum conceito ou ideia, para desfiar alguma tese. Mesmo a intenção de conceber uma história de amor, ou do luto advindo de sua súbita interrupção, onde a atividade sexual ilustra a emoção, foi tentado antes por Michael Winterbottom em 9 Canções, um projeto melhor sucedido. Não bastasse, Murphy e Electra não são tão singulares assim. Compõem apenas outra união disfuncional, cujo relacionamento é contaminado pelo ciúme e traições. Neste filme, o espectador é tocado pelo olhar e não seduzido pelo coração ou intelecto.

(Edgar Olimpio de Souza)

(Foto Divulgação)

 

Avaliação: Bom

 

Love

Título Original: Love (França / Bélgica, 2015)

Gênero: Drama, 134 min.

Direção: Gaspar Noé

Elenco: Karl Glusman, Aomi Muyock, Klara Kristin e outros.

Estreou: 10/09/2015

 

Veja trailer do filme:

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